Balança comercial favorável

28/10/2010

Inspirado no balanço do último trimestre da Vale publicado nesta semana, resolvi fazer o meu balanço, oras. Não são cifrões que acumulei nesses dois meses que acabo de completar, mas há sim um grande lucro, um saldo extremamente positivo.

Por mais desprendida que seja a pessoa, todos têm uma corrente, uma corda, amarrando os pés à sua origem ou passado recente. Ela faz a ligação com a memória, é a ligação com bons momentos de alegria, e também de tristeza, e que te liga para fazer reflexões sobre as decisões tomadas.

Mudar de vida não é fácil, mas também não é nenhum bicho de sete cabeças. Sempre disse, aos que me chamavam de corajoso, que “corajosos são os que passam a vida inteira fazendo as mesmas coisas, mesmo trabalho, mesma casa, e que não arriscam sabores e sensações novas com medo de uma possível derrota ou decepção”.

Essa coragem de passar a vida inteira trabalhando com dúvidas sobre o que escolheu, sob estresse, se desgastando, para no final dela (nem sempre) somar patrimônios e algumas viagens quando aposentado, sinceramente, estou fora.

Falo, também, em tom de brincadeira (mas com uma verdade implícita), que a sociedade inverteu a ordem da vida. Aposentado tem que ser quando é jovem, quando tem saúde, para correr, vibrar, sonhar, viajar, dormir em barraca e em rodoviária. Aposentado tem que ser jovem para vivenciar, transpirar realizações e frustrações. Deve-se aproveitar a vida quanto há saúde para mergulhar fundo e escalar arranha-céus. Depois, no final quando velho, perceberá que qualquer trabalho, qualquer emprego, é o suficiente para se satisfazer, pois sua bagagem, sua experiência, ninguém e nenhuma doença irá apagar.

Por isso brinco, digo que sou bon vivant, pois deve-se aproveitar a vida quando se tem, propriamente, a vida. Deve-se dar o valor ao suor em algo que realmente significa para você. Um amigo espanhol, Juan, me disse algo que nunca esquecerei: “Não tenho medo de ser pobre, afinal, nunca fui rico.”

É por isso que incentivo pessoas à mudança, incentivo em viajar, incentivo em mudar de profissão, casa, cidade, etc. Se não der certo, não esquente a cabeça, afinal, você seguiu seus sonhos, que é algo que poucos fazem, acredite. A dificuldade fortalece.

E, sob essa perspectiva, decidi uma mudança para a Suíça. Não conhecia ninguém na cidade, no país, não falo o idioma, não tinha conhecidos nem casa para ficar. Decidi porque é aqui que estão alguns antigos sonhos, os quais resolvi tirar da gaveta e arriscar: ter a oportunidade de estudar e trabalhar dentro de organizações que defendem causas humanitárias, ambientais, e que defendem um mundo internacionalista, sem fronteiras separando ricos dos pobres, brancos dos negros, etnias, religiões, opções sexuais, etc.

Não escolhi um país, escolhi um objetivo. Se fosse o Camboja, Belize ou Somália o país com tais organizações, iria dar um jeito de ir pra lá porque é isso que quero tentar.

Se vou conseguir ou não é outra questão longe ainda de uma resposta pois dois meses não são nada. Se vou aguentar morar num quarto sem janela que só o relógio me orienta saber se é dia ou noite, se vou aguentar a saudade dos sobrinhos, da família, dos amigos, se vou aguentar o frio da Europa e frieza dos europeus, se vou aguentar minha alimentação de sobrevivência, etc. e tal, isso tudo ainda não sei.  Mas vim pra tentar.

O relógio, por enquanto, caminha em marcha lenta, onde a falta de atividades estimula reflexões. Alguns dias me pego com nuvens pensativas rondando minha cabeça, mas que em nenhum momento causaram arrependimento das minhas decisões.

Assim, nos gráficos deste bimestre, minha balança comercial apresenta um superavit enriquecedor, de altíssimo lucro. A minha Bolsa de Mercados e Futuros registra recorde em valorização de títulos futuros, pois sei que toda essa experiência e os muitos sacrifícios passados serão benéficos para mim lá na frente. Mas, se der qualquer problema nessa trajetória, se uma crise mundial estourar, eu tenho uma boa bagagem que ninguém me tira.

Com 28 anos eu não tenho um puto no bolso, mas posso contar, ao menos, histórias para os meus sobrinhos. São escolhas, não sei se fiz as certas ou erradas, mas escolhi com a melhor das intenções.

Àqueles que focam dinheiro em primeiro lugar, para depois viver, eis um conselho: não relacionem sonhos com dinheiro. Eles não percorrem a mesma estrada. Dinheiro traz satisfação, felicidade é muito além disso.

Não incentivo rasgarem seus ternos, seus diplomas e venderem seus carros. O que incentivo é dar importância ao que realmente desejam na vida. Para todo o resto, dá-se um jeito.

Tempere sua vida sem esquentar a cabeça.

Marcio Vieira